E a capa gozadora, exibia os restos do que sobrara,
Pessoas insanas recebiam tudo que liam, sem se ater,
Já nem se surpreendiam com tanta barbárie,
E eu, sentado em minha escrivaninha esperava uma ligação,
Em um dia normal de primavera, me assaltava o coração,
O fato de amar tanto minha namorada, mas nos vermos tão
pouco,
Foram poucos os momentos vividos juntos, mas os guardaria
comigo,
Seus olhos, seu cheiro, seu gosto, ainda estavam em meu
corpo,
A saudade, insatisfeita, tentava agarrar-se a distância em
tentativa
Inútil de me fazer esquecer, dizia ela que onde um dia houve
o amor
Restaria apenas um vazio, pois tudo de bom ali, ela consumiria,
Eu me negava a todo custo a este sentimento de angústia,
Ferir de morte onde um dia existiu algo tão bom,
Não seria tolerável, não quando a questão referente fosse
amor,
É certo que amar a distância é frio, as vezes chega a
machucar,
Mas há tantos que convivem no mesmo ambiente e nunca
Chegam a estabelecer uma fala profunda que dirá dividir a
vida,
Apesar de habitarem o mesmo ambiente, vivem divididos,
Quatro pés perambulantes por suas casas frias e vazias,
Eu, porém, estava carregado por mim mesmo, sozinho, dois
únicos passos,
Mas sentia-me preenchido eu havia amado, por um momento
sublime
Que poderia recompensar uma vida toda sem ninguém,
Todavia, a maneira tolerável como as pessoas contemplavam
Aquelas notícias cada vez mais indigestas, me dava desgosto,
Nessa hora, eu ansiava pelo gosto dos seus lábios macios,
Pelo momento em que a tive em meus braços, bem apertados,
Como se quisesse mantê-la comigo por toda a vida,
Eu não poderia me acostumar com toda aquela barbárie,
Tendo jurado a ela, que a protegeria, que para sempre a
amaria,
O amor pedia passagem em uma estrada onde perambulavam
Pessoas vazias, feito fantasmas, isso não parecia chamar-se
vida,
Mas ninguém parecia se importar com isso,
Será que aquela a quem tanto amei também havia se encaixado
nisso?
Estaria, ela, em negação ao seu direito de existir de forma
digna?
Havia posto em cinco tábuas de madeira seu coração outrora
apaixonado,
E agora o selava, sobrepondo uma tábua sobre ele, como se o
dissesse: não ame!
E ainda o tivesse adornado com um laço negro,
Aquele mesmo que ela usava para adornar seus cabelos,
Aquele que eu adorava remover antes de provar os lábios que
tanto me faziam falta,
Queira Deus que não tivesse o enterrado a sete palmos,
A partir do instante em que se torna apenas um corpo
errante,
Condenado a meramente perambular sobre a existência,
Ainda haveria algo a ser feito pelo que se chama vida?
Espero que, tendo ela desistido de nós, já que nunca me
chamou de volta,
Ao menos tivesse deixado descrito o endereço de onde poderia
encontrá-la,
Eu escavaria o que fosse necessário apenas para tê-la de
volta,
Espero não estar desejando muito, mas um corpo sem vida não
me bastaria,
Do contrário eu poderia me entregar a qualquer uma,
Estivesse onde estivesse seu coração, eu juro: o buscaria!
Os anos haviam transcorrido como a enxurrada que passa sobre
a terra,
Aquela passageira que a toca a superfície, mas não chega ao
núcleo,
Ela, porém, quando me abraçou, quando me permitiu sonhar,
Foi além, e me levou junto, todos os olhos que eu
contemplara sem ela,
Estavam perdidos em vazios distantes demais, inalcançáveis talvez,
Ela não, tivera sido tão próxima, tão frágil, tão minha,
ainda podia senti-la,
Jamais seria possível esquecer, seria um tolo se pensasse
diferente,
Sozinha, em um canto, agora feliz, concordava a saudade,
Parecia que ela havia desistido de me ver sofrer,
Eu paguei um preço caro por estes anos em que me mantive
longe,
Mas, mais caro era o preço daqueles seres perambulantes lá
fora,
O amor se espalhou por mim como o sangue em minha alma,
E agora a desejava de volta, quem poderia resistir a um
pedido assim?
Eu sabia que tudo que vivi possuía suma importância,
Eu sentia que as lembranças me traziam uma falta desmedida,
Eu merecia tê-la de volta, apenas um instante apenas,
Minha velha jaqueta jeans estava pendurada na cadeira a minhas
costas,
No bolso um bilhetinho onde guardei o endereço dela,
Peguei-a, vesti e saí pela mesma porta onde tantas vezes
entramos juntos,
Quando encontrá-la iria dizer o quanto a amava, o quanto
estes anos sem ela
Foram difíceis e desestimulantes, é certo que guardei na
memória o caminho,
Mas o bilhetinho continha a letra dela, seu jeito e eu
parecia ouvi-la falar,
Percorri a distância que nos separava com uma rapidez
premeditada,
Mentir não era uma opção, me declararia e imploraria a ela
por sua sinceridade,
Caso ainda estivesse em seu coração, ela seria sincera, me
diria a verdade,
Tivesse me esquecido no decorrer destes anos, eu pediria uma
oportunidade,
Não queria negar-me há felicidade, a amar e ser amado
novamente,
Minhas intenções eram as melhores, meu sentimento o mais
íntegro,
Sempre fui verdadeiro, até encontrei tempo para aprender a
cozinhar,
Isso não seria uma qualidade a se desprezar, era o que ela
me dizia,
Eu a entendi, a distância que nos separou agora virava
poeira,
Tão ínfima, que seria carregada pelo menor vento,
Mas apagaria também nossos passos,
Aqueles em que vivemos separados um do outro,
Como se dissesse que o que passou não faria diferença,
Estaríamos juntos o que poderia importar mais que isso?
Se a distância me ensinou algo, foi ama-la sobremaneira,
Parei a distância de poucos metros, passei em uma relojoaria
e comprei um anel,
Pedi ao síndico do condomínio, ele me relatou ouvi-la chorar
em noites insones,
Disse que nunca soube de que ela tenha amado alguém,
Mas que ouviu de outras bocas, sobre relatos esparsos de
certo homem,
Ele nunca soube a identidade, ela sempre soube ser bastante
reservada,
Mas, em suas horas vagas gostava de folhear o jornal local,
Eu, então, fiz-lhe uma declaração relatando sobre a saudade,
Sobre o choro abafado pelo travesseiro, sobre perambular
pela noite,
A busca-la por todos os cantos, onde imaginaria estar, até
dormir no volante,
Com o carro estacionado em qualquer local incerto, sobre
O quanto sonhei com sua visita, o quanto ainda lembro de
tudo
Como se fosse ontem e o quanto a amo para todo o sempre,
Solicitei informações sobre se ainda me amava, se ainda me
queria,
Coloquei meu número a vista para que pudesse ligar,
O amor que um dia a entreguei, relatei: estava guardado,
Seguro dentro de mim, ela poderia buscar as informações que
quisesse,
Não obteria outra, eu a amei e nunca me permiti, nem um
instante,
Esquece-la, gostaria de ao menos um sinal para saber se isso
era importante,
Aguardava qualquer gesto seu para reclamar-me para sua vida,
Caso ela não aparecesse até as três horas daquela tarde,
Eu bateria a sua porta, com flores, bombons, o vinho que ela
gostava e o anel...