quarta-feira, 2 de novembro de 2022

A Mordida

 

Ergueu os olhos adiante,

E, na extremidade do fruto fresco,

Foi como se sentisse a sua face,

A maça roseada tinha quase uma textura,


Era como se recordasse o seu rosto,

Quis morder,

Depositou ali um fresco beijo,

Roçou os lábios como quem toca a pele


Sentiu na boca o gosto e o sabor doce,

Era como se o tivesse perto,

Sentia o cheiro,

Era mais que desejo,


Talvez, isso fosse amor,

Talvez apenas química,

Algo que explode ao toque,

Mas se apaga com a distância...


Talvez, talvez fosse mais que isso,

Andou um passo,

Agachou para pegar um galho solto,

Então, sentou-se na sombra do tronco da árvore,


Ali poderia colher mil frutas mais,

Mas, nem todas teriam o mesmo gosto

Ou despertariam mesmo sentimento,

Ao alcance,


Porém, também, da mesma forma distantes,

Ou mais um pouco,

Já não teria o sentimento de cansaço

E o desejo tão intenso de antes,


Ali, à sua frente, porém, bem longe,

Muito longe,

Lá, também tão longe havia aquele,

Sorriu e deu outra mordida tentadora,


Olhou para dentro da fruta e viu o brancor,

Límpido e transparente,

Parecia não haver muitos obstáculos ali na fruta...

Dessa vez, um sentimento terrível lhe ganhou com força,


Era sua lembrança esplendorosa e boa,

Era a sua boca, sua pele, seu cheiro,

A fruta já não trazia a satisfação de instantes,

Ela escorou-se junto a árvore,


Não via saída,

Teria de procura-lo o quanto antes,

Falar de todo o amor que sentia,

Abraçar-lhe e roçar uma mordida,


Suave e molhada e intensa...

Queria ter asas e poder voar ali feito as folhas,

Imaginou que aquelas mesmas folhas o tocariam,

Sentiu cansaço e algo de triste nisso tudo,


Quis correr mas foi como se suas pernas contivessem o aço,

Sentia-se pesada até mesmo para levantar-se,

À medida que o cheiro dele se aproximava,

Tudo o mais perdia o foco e a intensidade,


Seus contornos desenhavam-se diante do seu olhar,

Era como se estivesse tão próximo,

A distância deformava-se como se levada pelo vento,

Mas, não ventava apenas havia uma certa carícia de mãos macias,


Distintamente um túnel se abria diante dela,

Algo com um interior indefinível,

E de largura espessa parecia mais que contê-la,

Sentia-se estreita e arredia,


Como se portas a prendessem e a esmagassem,

Quase lhe faltava o ar,

Mas seu sorriso se mantinha,

E na boca o gosto,


Entregou-se a outra mordida,

Sentia uma fome intensa e aterradora,

E depois, viu-se mais próxima de si mesma,

Mesmo que isso significasse perde-lo,


Não se arriscaria a tanto,

Entregar-se a uma imagem e imaginar tê-lo,

Isso sim é que era disforme...

Encontrou uma saída em tudo isso,


Ali, parada e escorada feito indigente,

Naquele instante ter um nome

Ou um caminho definido não fazia sentido,

Era esta de fato a saída,


Mas desta saída não era possível sair,

Mas lhe era possível o sentir...

Provou o sabor da fruto com uma última gota de angústia,

Caminhara por quilômetros em sua busca,


Quase que doía o reencontro,

Quem ele era neste profundo de abatimento?

Talvez um alguém que não se lembrava dela,

Que não provava uma fruta com seu gosto,


Que tinha dentro dele mais que lembranças,

E esta, presença, não era a sua,

Não enquanto estivesse tão distante,

E não estaria mais perto,


Não para ele que não vinha,

Talvez, ele não pensasse em si mesmo,

Não mais.

Quem sabe via-se como alguém acima de tudo,


Inclusive do sentir,

Nem em si mesmo,

Nem Antonio pensava em Paola.


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