Aos sobressaltos de um coração cabisbaixo ante a nossa
discussão,
Haviam portas que protegiam nossa emoção do conhecimento
alheio,
Ele não teve noção disso, removeu-a com toda força, em meio
ao público,
Com suas crises de ciúmes em meio a rua, tornou nossa vida
pública,
Esses instrumentos de expor as brigas ao povo para que se
repense no que faz,
É um jogo de mão dupla em que você é tomado por uma vergonha
desmedida,
Ao mesmo tempo que repensa sobre as atitudes prevalecentes a
dois,
Se fere quando é de conhecimento público porque não fere
quando se está em casa?
Só porque se está de portas fechadas pode tomar a atitude
que desejar,
Sem medir as consequências, sem repensar que se está ferindo
quem se ama?
As palavras jogadas na cara doem por serem ditas? E se
fossem engolidas?
Feririam menos? Quando engasgassem na garganta, o que fariam
conosco?
Manter-se ferido por medo de tomar atitude torna as coisas
mais aceitáveis?
Aceitáveis para quem de nós, para aquele que vê tudo descer
rumo ao ralo,
E se coloca de lado, fingindo não ver o que está acontecendo
entre nós?
Embora doa ver tudo exposto do lado de fora de casa, que
efeito surte?
Não doiria menos o ato de calar-se ante aos fatos? Deixar em
suspense...
Nunca se arriscar ao desenrolar dos acontecimentos por medo
das consequências?
Guardar tudo a sete chaves dentro do peito até que tudo
exploda pelos ares?
Rompendo-se para fora, sentimentos, dores e angústias
emudecidas de outrora,
Olhar ele com maus olhos soaria de todo mudo ingênuo, mas
aprovar sua atitude?
Esperava encontrar aquele homem calmo de sempre, mas ele
estava disperso,
Embora não tenha encontrado em mim o medo, encontrou algo
desconhecido...
Hesitação, talvez? Não saberia precisar ao certo, mas agora
era tarde demais,
Encolhi os ombros, decidi virar o jogo, indiferença foi o
que conseguiu alcançar,
Vi nos seus olhos algo que eu não conhecia, aquilo me soou
em notas falseadas,
As palavras que eu gostaria de ter falado em meio a rua, não
passaram de suspiros,
Eu sabia que se tentasse contrapor eu gritaria, tudo estava
inflamando contra mim,
Mantive os olhos baixos, não tive coragem de encarar os
fatos, evitei as pessoas ao redor,
Ainda assim ante ao silêncio ao nosso entorno, creio que
todos ouviram os relatos,
Todos viram-no expressar seu ponto de vista, quanto ao meu,
já não importava,
Meus olhos falavam por mim, o silêncio em minha fala,
denunciava-me: bastava,
O homem para quem entreguei o meu amor, vinha contra mim e
era assustador,
Eu encolhia os ombros sem conseguir reagir cautelosa quanto
ao desenrolar,
Ele ainda me ama, murmurei para mim mesma, olhando-o, com
distância precisa,
Levantei o queixo, em um ato de aceno meio que incompleto,
estudei sua postura,
Ele havia desistido de nós, o que seria mais importante para
ele agora?
Expor-nos, porta a fora? Nossa vida conjugal jogada na rua
aos olhos de estranhos,
E eu que sempre acreditei ver amor em seu olhar, nunca
imaginei que algum dia se voltaria,
Concordei movendo a cabeça uma única vez, gesto medido,
impondo um fim a aquilo,
Peguei minha sacola que fora remessada ao chão, por
descuido, e mudei minha rota,
Havia um risco nela, eu a havia comprado com o meu dinheiro,
o que importaria?
Restava-nos salvar um ao outro, me apeguei a isso, não
queria ver-nos destruídos,
Ele suspirou em tom de vitória, parecia ter conseguido o que
queria,
Olhei para trás de soslaio, decidi acreditar nele, o melhor
para nós se desenvolvia,
Há instantes mais fortes do que acreditamos, estes instantes
decidem as coisas,
Dão um rumo diverso, mesmo que pareça incerto à primeira
vista, me apeguei a isso,
Embora não tenha gostado da ideia, decidi repensar os fatos
com cautela,
Rever de ato a ato, mesmo tendo me sentido ofendida, eu poderia
estar enganada,
Meu coração batia em teimosia, parecia discordar do que eu
dizia para mim mesma,
Eu já não me convencia sobre o nosso amor valer a pena, doía
em mim suas maneiras,
Como dar de ombros ao que eu sentia? Ignorar a mim mesma por
um amor fracassado?
A palavra soou avessa aos meus lábios, mas parecia se
definir sobre o nosso destino,
Ele havia jogado a minha alma em meio a rua, eu estava
caída, ele recusou-se a me salvar?
Os anos que desenrolamos juntos pareciam apertar os nós
contra nossos pescoços,
Perderia a cabeça por desistir de nós ou por engolir as
investidas de cólera na garganta?
Meu sangue fervia, minha visão ficava turva, de tudo que
talvez algum dia fomos,
Parecia não restar nada em que se apegar, apertei meus
lábios quis engolir as palavras,
Sem conseguir conter o pensamento me indaguei: onde ele
estaria agora,
Justo quando eu mais precisava? A dor que ele causava em
mim, ele mesmo curava, e agora?
Dependência tinha um nome, abstinência se tornaria a rotina,
deveria me perguntar sobre ele?
As palavras vinham até a minha boca por uma vontade própria
e inconsequente,
O nó se apertava contra a garganta, nosso nós parecia estar
se colocando no singular,
Algo valeria mais para ele ou era eu quem não entendia
direito nossa própria história?
Esperei ansiosa para que algo acontecesse, esforcei-me para
parecer indiferente,
Sentia que meus gestos denunciavam meus pensamentos, estava
falhando com a gente,
O modo como ele reagia através de impulsos desmedidos estava
surtindo efeito,
As promessas e as flores deixavam de fazer a diferença entre
nós dois,
A oportunidade de entregar o amor sempre é possível, porém
quando perdida,
Não sei ao certo se volta a ser acessível, as disposições
nem sempre estão a postos,
Às vezes, mesmo aquilo que você acredita nunca perder, se
esvai ante o seu olhar,
Que influências podiam estar atuando que nos colocava à contramão um do outro?