domingo, 15 de maio de 2022

A Janela

Lá fora, o vento parecia cantar,

Assoviava uma canção que eu não queria escutar,

De longe parecia avistar uma chuva,

Não me dignei a olhar através da janela,


Mas de alguma forma, talvez pela brisa fresca,

Ou o calor que levantava da terra,

Eu parecia senti-la, ela vinha serena,

E forte, aquele dia nublado guardava algo,


De se ver a poucos instantes,

Estava apenas instável mas sem justificativa,

Nada que pudesse definir algo de diferente,

Parecia previsível demais,


Eu me joguei sobre a cama com as mãos nos ouvidos,

Eu não sei o que dizia o vento,

Mas entendo que me recusava a ouvi-lo,

Se ele trazia a chuva ou perambulava sozinho,


Eu não sei, era meia tarde e eu me recusava a tudo,

Sim, eu poderia imaginar que era apenas uma música,

Que algum desavisado ouvia a certo volume,

Mas, quem negaria que fosse o vento?


Me sentia em meio a um deserto um tanto a esmo,

Uma dor ávida me devorava por dentro,

Se eu fui capaz de amar algum dia,

Isso já parecia pertencer ao passado,


Uma dor terrível me consumia,

Com dentes e garras que destroem tudo,

Feito flechas a longa distância,

Que não servem para mais que ferir,


Chego a duvidar de que queria brincar com minha dor,

Era alguma outra coisa um tanto mais fria,

Tivesse me atingido não sairia mais de que sangue,

Quem sabe nem ao menos penetrasse a pele,


Mas, então porque me feria tanto por dentro,

Ou o quê? Uma língua quente a efeito de espada afiada

Havia me dado um beijo um dia,

Se me lembro bem não foi a tanto tempo,


Agora aquela língua arranhava e feria,

Áspera e ávida soube como me agarrar,

Sobre a minha alma ela rasteja em sua glória,

Conhece todos os recantos e abusa tudo que pode,


Me sinto abatida, estou quase sem forças,

É como se ela tivesse aberto uma cova em meu destino,

Tudo quanto sonho que eu tive sucumbiu lá dentro,

Um passo em falso e eu mesma estaria lá,


Caída nas profundezas de tudo que fui capaz de sentir e acreditar,

Com o coração firme e no alto,

Ainda seria capaz de acreditar em saídas,

Com o céu escorregadio e fora do alcance,


Há instantes em que tudo se perde,

Por que eu teria que sempre ter uma resposta?

O vento agora parecia ter instrumentos,

Açoitava lá fora, brincava e fugia,


Eu não, nem ao menos fui até a janela,

Acorde minha alma,

Quis me dizer mas permaneci impassível,

A cova cavada por aquela língua não admitia saída,


Acorda, alma, sonhos e tudo o mais,

Vou despertar quem sabe possa abrir a janela.


 

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