O dia em que o conheci amanheceu pardo,
O sol se levantou irritadiço,
Assim que me viu pareceu cansado,
Foi como se horas percorressem os segundos,
Bem, parecia querer adiantar a tarde,
Apenas mais tarde, muito mais tarde,
Pensei que quisesse nos ver,
Eu e aquele – aquele que prefiro evitar o nome,
O vento chegou temeroso,
Algo de tudo que se transcorreu não pareceu certo,
De repente, esquecer não era o bastante,
Um dia eu disse- antes não tivesse existido,
Porém, isso não servia para o hoje,
Embora ele me tocasse com sua cauda fria,
Deixava a vista alguns pássaros,
Que percorriam por entre nuvens densas,
Rápidos o bastante para passar despercebidos,
Então, pressenti comigo mesma,
-Queriam ser vistos.
Mas, não me soou como se tivessem algo a contar,
Apenas, talvez não estivessem tão tristonhos,
Como eu, eu também não me sinto.
Eu observava enquanto levava os bois,
De dentro da carroça onde eu estava,
Todo o redor soava tranquilo,
Menos alguns poucos detalhes sem importância,
Quando uma lufada intensa e fria me tocou as costas,
Confesso que me senti estranha,
Não diria amedrontada,
Mas ainda não encontro a palavra,
Deus me poupe de voltar atrás nas lembranças,
-Não, não quero vê-lo,
Disse para mim mesma,
Enquanto virava o rosto para o lado,
Contemplava as árvores enquanto baixava o boné,
Escondi meu rosto.
Até o campo dos pastos verdes e roxeados eu fui
escoltada,
Depois de lá,
O vento mudou para todos os lados,
Será verdade?
Pensei comigo mesma.
Será que algum dia o passado retorna?
E por quê eu iria querer revê-lo?
Seriam os deuses tão cruéis dessa forma?
Retirá-lo da minha vida apenas para eu me apaixonar,
Quase sorria de tanta ironia,
Até me vejo doida percorrendo as ruas a sua procura,
Então o encontro,
Ele poderoso e cheio de si mesmo – soberbo,
Acreditando que é o melhor e inesquecível,
Eu a idiota capaz de tudo por ele,
Contudo alego ser por amor,
Por amor, quanta coisa eu seria capaz?
Pássaros beijam suas noivas e voam até o mais alto,
Apenas para tomar o beijo do outro,
Bicam seus bicos e retornam com o beijo,
É como se sendo de um deles
Ela fosse a única,
-Há outras, eu os digo.
Até sinto que me olham e contemplam,
Mas, não há. De alguma forma não há para eles,
Aparece a outra mais jovem e tolerante,
Vê a outra e seus defeitos,
Não aqueles,
Não os que brigam por ela.
O outro – o tomado, roubado, sei lá,
Foge em ruínas e desespero,
Voa rápido como nunca o faria,
Temo que se jogue contra a terra nua,
Mas não, arranca uma folha do pasto e sai,
Até penso que irá construir a casa,
Dou um pássaro para trás
Me sento na parede da carroça de tábua,
Acho que a espera,
Enquanto a outra se cansa e vai embora,
Vejo que o que está com o beijo roça a boca dela,
É como se o beijo roubado fosse o mais importante,
Ele não teme tocá-la,
Ele gosta de o ter e esfregar na cara dela?
Decido não ser tão romântica.
O beijo agora é um dos inimigos,
O esquecimento quase uma injustiça,
Quem irá pensar em quantos beijos
Se é capaz de se dar num único dia?
Imagine no transcorrer de um ano em quantas bocas.
O sol parece não gostar disso,
Logo em seguida ele some no horizonte,
Queria saber porque eu estremeço,
O procuro, agora o acho importante.
O pássaro era marrom telha parda,
Longe da cor terra molhada,
O beijo era algo tentador entre eles,
Uma espécie de triunfo, troféu de vencedores,
Há ali um macho e uma fêmea,
A procuro e ela me contempla de olhos vermelhos,
Não entendo,
Ela não era assim a poucos segundos,
Não deveriam os deuses terem mandado um sinal?
Qualquer coisa que fosse para eu não me sentir assim,
Como se todo o meu redor conspirasse,
Sei lá, um sopro do destino,
Olho para o chão e estendo minha mão aberta,
Penso que de alguma forma eu poderia puxar a pedra,
E trazê-la, sem tocar ou chegar perto dela,
Sinto medo e prefiro acreditar que não é possível,
As pedras e seu redor tudo tão frio,
As pedras seriam capazes de se aquecer perto de mim,
Sim, elas seriam...
Me desfaço deste pensamento.
Coisa estranha, sigo meu caminho.
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