sábado, 25 de fevereiro de 2023

Pássaros no Caminho

O dia em que o conheci amanheceu pardo,

O sol se levantou irritadiço,

Assim que me viu pareceu cansado,

Foi como se horas percorressem os segundos,


Bem, parecia querer adiantar a tarde,

Apenas mais tarde, muito mais tarde,

Pensei que quisesse nos ver,

Eu e aquele – aquele que prefiro evitar o nome,


O vento chegou temeroso,

Algo de tudo que se transcorreu não pareceu certo,

De repente, esquecer não era o bastante,

Um dia eu disse- antes não tivesse existido,


Porém, isso não servia para o hoje,

Embora ele me tocasse com sua cauda fria,

Deixava a vista alguns pássaros,

Que percorriam por entre nuvens densas,


Rápidos o bastante para passar despercebidos,

Então, pressenti comigo mesma,

-Queriam ser vistos.

Mas, não me soou como se tivessem algo a contar,


Apenas, talvez não estivessem tão tristonhos,

Como eu, eu também não me sinto.

Eu observava enquanto levava os bois,

De dentro da carroça onde eu estava,


Todo o redor soava tranquilo,

Menos alguns poucos detalhes sem importância,

Quando uma lufada intensa e fria me tocou as costas,

Confesso que me senti estranha,


Não diria amedrontada,

Mas ainda não encontro a palavra,

Deus me poupe de voltar atrás nas lembranças,

-Não, não quero vê-lo,


Disse para mim mesma,

Enquanto virava o rosto para o lado,

Contemplava as árvores enquanto baixava o boné,

Escondi meu rosto.


Até o campo dos pastos verdes e roxeados eu fui escoltada,

Depois de lá,

O vento mudou para todos os lados,

Será verdade?


Pensei comigo mesma.

Será que algum dia o passado retorna?

E por quê eu iria querer revê-lo?

Seriam os deuses tão cruéis dessa forma?


Retirá-lo da minha vida apenas para eu me apaixonar,

Quase sorria de tanta ironia,

Até me vejo doida percorrendo as ruas a sua procura,

Então o encontro,


Ele poderoso e cheio de si mesmo – soberbo,

Acreditando que é o melhor e inesquecível,

Eu a idiota capaz de tudo por ele,

Contudo alego ser por amor,


Por amor, quanta coisa eu seria capaz?

Pássaros beijam suas noivas e voam até o mais alto,

Apenas para tomar o beijo do outro,

Bicam seus bicos e retornam com o beijo,


É como se sendo de um deles

Ela fosse a única,

-Há outras, eu os digo.

Até sinto que me olham e contemplam,


Mas, não há. De alguma forma não há para eles,

Aparece a outra mais jovem e tolerante,

Vê a outra e seus defeitos,

Não aqueles,


Não os que brigam por ela.

O outro – o tomado, roubado, sei lá,

Foge em ruínas e desespero,

Voa rápido como nunca o faria,


Temo que se jogue contra a terra nua,

Mas não, arranca uma folha do pasto e sai,

Até penso que irá construir a casa,

Dou um pássaro para trás


Me sento na parede da carroça de tábua,

Acho que a espera,

Enquanto a outra se cansa e vai embora,

Vejo que o que está com o beijo roça a boca dela,


É como se o beijo roubado fosse o mais importante,

Ele não teme tocá-la,

Ele gosta de o ter e esfregar na cara dela?

Decido não ser tão romântica.


O beijo agora é um dos inimigos,

O esquecimento quase uma injustiça,

Quem irá pensar em quantos beijos

Se é capaz de se dar num único dia?


Imagine no transcorrer de um ano em quantas bocas.

O sol parece não gostar disso,

Logo em seguida ele some no horizonte,

Queria saber porque eu estremeço,


O procuro, agora o acho importante.

O pássaro era marrom telha parda,

Longe da cor terra molhada,

O beijo era algo tentador entre eles,


Uma espécie de triunfo, troféu de vencedores,

Há ali um macho e uma fêmea,

A procuro e ela me contempla de olhos vermelhos,

Não entendo,


Ela não era assim a poucos segundos,

Não deveriam os deuses terem mandado um sinal?

Qualquer coisa que fosse para eu não me sentir assim,

Como se todo o meu redor conspirasse,


Sei lá, um sopro do destino,

Olho para o chão e estendo minha mão aberta,

Penso que de alguma forma eu poderia puxar a pedra,

E trazê-la, sem tocar ou chegar perto dela,


Sinto medo e prefiro acreditar que não é possível,

As pedras e seu redor tudo tão frio,

As pedras seriam capazes de se aquecer perto de mim,

Sim, elas seriam...


Me desfaço deste pensamento.

Coisa estranha, sigo meu caminho.


 

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