As mãos jaziam ao lado do corpo,
Costas para um sonho destruído,
Cabeça ao vento para o futuro,
Rosto voltado para um outro arquivo,
Mas no momento em que ele a despiu
Era como se voltasse a ser menina
E sofresse suas primeiras sensações,
Até as roupas jogadas no chão pareciam flutuar,
Nas roupas os sonhos,
Sonhos despidos para um primeiro beijo,
Desconforto de quem investe tudo,
Uma entrega sem medo,
Talvez, aconchegada em seu abraço,
Com vistas do futuro onde estava,
Tivesse acredito para além do que foi o gesto,
Quem sabe sentiu-se amada.
A menina que agora anda sozinha,
Ainda vê que o frio humano é pior que o da noite,
Mesmo que ainda guarda as faíscas,
Que sinta-se prestes a arder em chamas,
Este é um frio deliberado.
Aquele é preordenado- comandado.
As carícias que percorrem o corpo
O conhecem demais para se fugir totalmente,
Fica a marca e nela o sentimento,
Trata-se de algo mais que desejo,
Não possui forças para levar a mão ao coração
Que bate triste e apertado,
Tão melhor quanto tinha um outro peito
Para se amparar,
Agora é um retorno ao seio antigo,
Não mais contar com um ombro amigo.
A solidão anterior parecia mais amena,
Agora esta vinha avassaladora e de todos os lados,
Não, não podia levantar o olhar,
Lhe restava o chão baixo,
Onde tudo parecia estar no lugar,
As roupas alinhadas ao corpo,
A calçada rígida em que pisar,
Continuaria só.
É assim que acontece depois de um longo beijo,
Angústia extrema ante a ideia de não mais vê-lo,
Em certos casos,
O amor chega de maneira desconcertante,
Vê-se isso na beirada da saia rasgada,
Na ausência do tecido que ficou pregado a porta
Devido a rapidez da saída do ambiente,
Soa quase feito uma declaração de indiferença,
Alma dilacerada, coração a pigarrear desgosto,
É o horizonte dizendo:
-Que me importa?
Ela não para ou pensa em nada,
Segue apenas por ter um chão em que pisar,
Momento lamentável aquele em que chegou a cogitar,
Entregar-se sobremaneira a um beijo,
Vive-lo em intensidade por uma noite inteira,
Desejar que o amanhã que os presenciasse juntos,
Também pudesse fazer algo para mantê-los desta forma,
Seria mais fácil ter deitado naquela cama
De lençóis brancos e tecido frio tanto quanto macio,
Para fechar os olhos e ao invés de receber o beijo,
Ter em seus lábios a morte repousada,
Porém, recostou a cabeça em seu ombro
E pôs a dormir neste sonho,
Cega confiança no amor que agora a força a andar,
Caminha em direção oposta ao que fez,
Rua sem saída,
Com certeza – sem saída.
Contudo, ela não anda se arrasta,
Mantém-se em pé pela intensidade do que viveu,
Segue, mesmo sem querer admitir,
Porque desejo muito tê-lo a sua frente,
Existe uma âncora na misericórdia,
Nesta âncora um abraço há de esperar,
É neste olhar de misericórdia que ela preserva sua
vida,
De repente, para e o vê como uma ameaça,
Pôr todos os seus sonhos num único ato,
Desfecho quase premeditado... – fracasso.
Àqueles que o silêncio consterna,
Um rugido apraz,
Esta ameaça de misericórdia ressoa mais a promessa,
Aquela feita durante o beijo,
Selada com um gemido de desejo saciado,
Há em seu coração um ser vivo desperto,
Este ser a guia de algum jeito desconhecido,
Que o rugido de seus desejos a espere no caminho,
Um amor que foi luz não se acostuma com o escuro.