quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Torrentes de Água

Choveu por toda parte,
A chuva embaçou o para-brisa,
Deixou cega a toda vista,
E retirou-a de seus devaneios,
Assim que lama marrom
Junto de muita água suja
Invadiram a pista
E tentaram rodopiar os pneus,
Tornando a frenagem nula.
Ela diminuiu toda a marcha,
Engatou a primeira,
E parou de súbito,
Indo direto para fora da pista,
Num lugar de brita e terra,
Numa espécie de manobra arriscada,
Freou e de súbito,
Próxima a um coqueiro parou,
Numa proximidade assustadora.

Os bancos do carro encharcaram,
A frente do carro molhou,
Porém, nada pareceu parar de funcionar,
Ar-condicionado,
Alerta, pisca, parte elétrica...
Nada.
Ela encostou a mão no volante,
E a cabeça sobre a mão,
E levantou os vidros da janela,
Sentiu-se trêmula,
Ligou uma música baixa,
E ficou a esperar
Que ao menos um côco caísse,
Ou que a chuva diminuísse.

Não se enxergava nada a frente,
A rua virou um rio de água derrapante.
Então, uma camionete alta,
Fechada, cabine dupla,
Parou ao seu lado ,
Simplesmente,
Como se fosse uma bailarina
De gelo,
Deslizou, livremente.
Parecia não estar naquela
Lamaçal,
“Homens são tão mais seguros”.
Ela pensou,
Soltando um soco no volante,
Sentia medo.

Medo medonho.
Um estrondo rompeu os céus,
Tingindo-o de branco,
Um raio,
Logo a frente estourou uma árvore,
Ela pendeu ao chão,
Cortada só meio,
Sobrou apenas alguns galhos
Que balançavam na chuva,
E escorriam a água até o chão.

Ela gritou amedrontada.
Ele abriu a janela.
Sorriu, e fez um gesto de cumprimento.
- Oi, protegendo-se da chuva?
Ele indagou com rosto lindo,
Sereno, seguro e atraído.
Ela sentiu vergonha por estar ali
Tão próxima a árvore,
E tão fragilizada.

A folha do coqueiro balançava,
E tocava seu carro,
Molhando, talvez, o motor.
E ela sem entender se isto,
Seria bom ou ruim,
Ou nada interferisse.
- pois é.
Iniciou a chuva e...
Derrapei.

Mesmo hesitante,
Contou a verdade,
Pela primeira vez quis admitir
Que precisou de ajuda
E que sentia medo.
Ele saiu do carro dele,
E a água vinha em torrentes,
Molhou sua camiseta branca,
Fez voar para longe o seu boné,
E abriu o zíper da calça,
Quase soltando o botão,
O fez resvalar,
Mas ele chegou até ela,
E pediu para sentar ao seu lado.

Ela aceitou.
E assim que ele entrou
O abraçou.
E juntos separaram a chuva
Acalmar-se.
Ela só desejou afastar as lembranças
E enterrar o marido,
Que há tanto tempo morreu
Mas que ela teimava em manter ao seu lado,
Numa expectativa viva demais,
Apegada demais,
Quase doentia,
Quem parte não é igual ao que estava.

A morte leva.
Deixa memórias,
Vivências,
Lembranças,
Mas, a morte precisa levar.
É doentia demais a morte que deixa.
Doentia de se viver,
Doentia quando anula,
Quando fere
E assusta.

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Choveu por toda parte, A chuva embaçou o para-brisa, Deixou cega a toda vista, E retirou-a de seus devaneios, Assim que lama...