domingo, 3 de janeiro de 2021

Um Homem Triste

 

Algo ainda me fazia insistir em meu destino,

Duvidava que fosse Deus, mas ainda não havia

Vendido minha alma ao inferno, a cedido ao diabo,

Você pode achar que eu desisti de viver,

Mas isso está longe de ser verdade,

 

É certo que agora estou com a cara no chão,

Tenho minha integridade violada pelas minhas costas,

Minhas mãos estão presas, emudecido está o meu coração,

“Estuprado – mãos ao alto”, pude ouvir através do silêncio frio

Do estrondo que me feria por dentro,

 

Um grito silenciado na garganta, um homem ferido ao chão,

Na alma de um selvagem um gemido,

Ao meu redor o silêncio de pessoas que fingiam não ver,

Estavam cegas em si mesmas, fechadas em suas próprias dores,

Eu tinha sorte por ser dessa forma, não tinha?

 

Já pensou se pudessem ver através da minha cara tudo que eu sentia?

Imagina se pudessem ver pelos meus olhos a dor que escorria?

Meu nome escrito em letras gritantes de vergonha,

Indigno, eu me sentia, carente de força para me levantar,

Palavras cuspidas escoriam por minha cara,

 

Me sentia cegado, emudecido, entregue a dor,

Via tudo que eu era tornar-se frio esvaziando-se em sangue,

Algo me consumia por dentro, roubava-me de mim,

Pobre homem que ousou sonhar alto demais,

Caiu ao solo seco, tiro certo, voz silenciada,

 

Pena de morte premeditada, violar-me até tirar-me de mim,

Eu teria sorte em estar vivo, não teria?

Eu deveria cooperar se quisesse salvar a mim mesmo,

Eu deveria me mexer, no entanto, caí estagnado,

A dor me corroía por dentro, sangue escorria em minhas entranhas,

 

Uma vida roubada pelo vão de dedos ferinos,

Eu desejei falar, objetar, mas quem me daria ouvidos,

Eu era um homem condenado ao chão da terra fria,

Que agora estava molhada, embebida em lágrimas?

O que é isso que escorre em mim agora?

 

Preciso de água, sinto cede, preciso ir ao banheiro,

Algo dentro de mim não está certo, nada parece fazer sentido,

Será que sobrou muito de mim para confirmar algo,

Será que um banho quente vai tirar o frio do corpo?

As marcas que sinto pesarem dentro do espaço

 

Que se abriu em minha alma, em meu peito?

De algum modo consegui esconder a dor, em algum lugar,

Agora o vazio aberto em mim poderia abrigar muitas coisas,

Eu poderia marchar feito um soldado armado,

Sem precisar me condenar aos becos da cidade,

 

Que já estava cansada de noticiar este tipo de espécie,

Diziam eles, espécie de crime, cultuado pelos ignorantes,

Esquecido pelos inteligentes, ignorados pelos que não entendem,

Entendimento era tudo que eu não tinha naquele instante,

É cediço, que a lei me abrigava a denunciar o ocorrido,

 

Embora eu já tivesse conhecimento do tormento que seria

Tomar uma atitude desta amplitude, ouviria julgamentos,

Seria vitimizado, reviveria este momento por mil vezes seguidas,

E aqueles olhos me seguiriam, talvez isso fosse o suficiente para me manter calado,

De vítima a ofensor, eu havia sido estuprado quem queria ouvir isso?

 

Do grande e forte homem que eu era, agora o que havia restado?

Dói, sangra, fere a alma eu poderia alegar, mas quem entenderia?

Eu merecia conforto, queria abafar o grito de socorro,

Mas me ensinaram a calar o choro, sofrer em silêncio,

Eu havia sido um alvo fácil, agora, porém, me sentia agressor,

 

Cada vez que eu tentava citar o fato, buscando entender o ocorrido,

As pessoas desviavam a atenção, pareciam estar ensurdecidas,

Haviam, então, se acostumado as violações, para ter direito a ser alguém,

Cadê a bandeira que eu ergui buscando por dignidade?

Mesmo quando minhas queixas chorosas chegassem até a delegacia,

 

Eu teria que enfrentar outros homens ou mulheres

Olharem no fundo dos seus olhos e dizer: “sim, sim, fui ferido de morte”,

Há algo de pior para a alma de um ser que nasceu para ser forte?

Condenado a prisão de sofrer calado, de vencer por si mesmo,

Eu procuraria por consolo, alguém levantaria a voz em meu amparo?

 

Olhos famintos e reprovadores me cuidavam,

Me sentia vigiado, tentei me manter afastado,

Qualquer um teria feito o mesmo, mas me encontraram,

Mancharam meu corpo, cabularam meu pranto,

Eu senti medo, nenhum homem merecia ser ferido a este ponto,

 

Ninguém merecia provar tal dor dilacerante,

Meus punhos antes de aço, renderam-se presos,

Eu queria gritar sou homem, não faça isso comigo,

Mas foram poucos minutos, eu iria sobreviver,

Conseguia ver no rosto dos transeuntes que haviam outros,

 

E talvez, não parassem, alguém teria que dar um ponto final,

Não teria? De vítima a agressor um passo que não fora prescrito...

Na noite seguinte, eu tomaria mais cuidado, repetia para mim mesmo.

sábado, 2 de janeiro de 2021

Dormir de Conchinha

 

Eu ficaria a noite toda acordado cuidando dela,

A vida toda ficaria velando o seu sono,

Se eu conseguisse, pois, vê-la segura em meu abraço,

É minha realização, é onde deposito minhas esperanças,

A protejo do real, do imaginário, de tudo que for necessário,

Pois a amo de uma maneira única, que nenhuma outra mereceria,

 

Senti-la repousar em meu braço é o que me faz homem,

Vê-la dormir serena é tudo que sempre imaginei fazer,

Desde a primeira vez que a vi, me faz tocar o céu

Ouvir ela sussurrar no meu ouvido que ama meu cheiro masculino,

De homem, seu protetor; os instantes em que em seus sonhos

Vejo ela me procurar, ressonando, buscando meu cheiro, meu carinho,

Me faz completo, me faz realizado, me faz inteiro,

 

Eu chego a pensar que durmo muito mais do que gostaria,

Preferiria passar insone a noite toda, a contempla-la,

Ela acorda pela madrugada, suspira, se encosta em mim,

Me procura, se ampara e me pede para dormir,

Unidos como um só corpo, nos sinto flutuar,

 

Uma noite as 3:15 da manhã, ela ressonou, procurou meu cheiro

E não me encontrou, eu havia ido ao banheiro,

Ouço ela soluçar assustada, triste, magoada, volto correndo,

E vejo que ela ainda nem abriu os olhos, apenas sentiu minha falta,

Deito e abraço-a com todo o meu amor e vejo que não há nada maior que isso,

Às vezes, ela acorda, me pede água e eu busco para ela,

Me satisfaz como homem ver ela saciada, feliz, contente comigo,

 

Não medimos esforços para realizar um ao outro,

Ela odeia dormir sem mim, e gosta de deixar isso bem claro,

A cada vez que acorda pela madrugada enroscando os pés às escuras,

A procura de água, do banheiro, do que for que seja,

E eu também, não durmo sem ela do lado, gostamos de ser assim,

Quando se ama não há nada pior do que deixar seu bem mais valioso,-

 

A pessoa que amamos, sozinha-, ainda mais conhecendo seus medos estranhos,

Nós pertencemos um ao outro, nos completamos, nos realizamos, isso é tudo,

É claro que antes de nos conhecermos dormimos sozinhos, isso é obvio,

Mas a partir do momento em que juramos cuidar um do outro,

Cumprimos isso à risca, mesmo se nos custasse a própria vida,

Nós não sabemos ao certo se acreditamos ou não em vidas passadas ou futuras,

 

Por isso nos dedicamos com integridade ao presente, simplesmente vivemos,

Nós adoramos escrever um para o outro o quanto nos amamos,

Fazemos todos os tipos de declarações, até aquelas bizarras, adoramos os sorrisos roubados,

Estes que surgem do nada e que, quando estamos sozinhos gostamos de recordar,

Só para rir mais um pouco, feito dois bobos, aquelas gargalhadas que fazem doer a barriga,

Ela adora se esconder pelas paredes e sussurrar ao meu ouvido:

 

Um amor para a vida toda ou um beijo roubado?

Os dois, respondo e a seguro em meus braços, isso é absolutamente maravilhoso,

Esta declaração pode parecer um tanto quanto bajuladora,

Mas é a realidade expressa pelas mãos de quem muito ama,

E que é profundamente amado também, me sinto seguro quanto a isso,

Não admitimos fofocas um sobre o outro, nem paira mentira sobre os nossos atos,

 

Somo unidos, íntegros, o amor em sua forma íntegra é o que nos une,

Não são ideias, relatos, nem nada, unicamente amor,

Os outros se importando ou não, essa é a verdade,

Nossos planos pertencem a nós dois, nossas vitórias são nossas,

Cobrar algo dela iria parecer chantagem, em nosso relacionamento

Nós nos doamos, nos entregamos de forma espontânea,

 

Se é possível estabelecer um preço para as coisas como o amor ou a vida,

Eu diria que é saber viver, se entregar de maneira profunda,

Respeitar, acreditar um no outro, evitar evasivas, construir-se através do diálogo,

Ver ela chorar, me fere muito mais que a mim mesmo,

Me ferir ataca a ela mais que o cometimento de um crime bárbaro,

Estupro ou pânico são aversões que ninguém poderia medir,

 

São coisas que ferem o corpo e machucam a alma, e quem é que poderia

Calcular um preço a algo nojento desta magnitude,

Qual seria a pena justa para quem rasga a pele e dilacera a alma de alguém?

Imagine a amplitude desta aversão quando ocorre contra quem se ama?

Isso são questões que entrego para as senhoras que gostam de tricotar,

Quanto a nós, nos amamos profundamente, respeitamos a realidade

Um do outro, cuidamos dos nossos machucados, entregamo-nos,

 

Sempre que possível seguramos a mão um do outro,

Seja em um passeio, na cama ou o que for, gostamos de demonstrar presença,

Gostamos da segurança de estar juntos, de simplesmente amarmo-nos,

Isso são questões que a sociedade precisa considerar,

Negar-se a ver o que a moral, a lei, a ordem, os bons costumes, ou seja, o que for

Jogam nas nossas caras no nosso dia a dia não deveria passar despercebido,

 

Sempre vejo a vizinha trocando farpas com a outra do lado,

Falando da vida alheia, mas comentamos eu e meu amor,

Quem é que cuida dos desafortunados expostos as agressões de todo tipo?

Há quem relate que um crime em que se ceifa a vida de uma pessoa por dinheiro

É mais cruel que certas formas de terrorismo ou o estupro,

De fato, o direito à vida deve prevalecer, mas, e quando nos furtam o direito de viver?

 

Condenando a perambular sobre a terra feito corpos errantes, violados,

Condenados ao silêncio devido ao medo, a vergonha do julgamento,

De enfrentar, admitir: sim, fui estuprado, sim fui ferido e isso dói,

Vou depor, me expor, mexer com uma faca invisível as feridas dilaceradas,

Transcorrido o tempo do processo, serei chamado ao tribunal,

Cutucar com uma lâmina afiada as feridas que já pareciam cicatrizadas,

Que Deus me ajude para que pelo menos eu não tenha que aturar de novo,

 

A cara do agressor ou da agressora, sim, porque eu sujeito homem,

Também padeço, e sou suscetível a cair no vão do estupro,

E para mim, ter que falar, talvez doa mais ainda,

Eu sou homem e tentaram tirar meu direito de sê-lo,

Sobrou o que de tudo que fui, ignoraram meu pênis, fui sufocado,

 

Me feriram com agressões, me jogaram no chão, e ficaram sobre mim,

Me seguraram com uma única mão sobre o meu peito,

Desejaram silenciar o amor que eu poderia sentir algum dia?

Me socaram por trás, no fundo, me ignoraram, sou nada e agora?

Os músculos dos quais me orgulho, não me ajudaram, falharam na hora H,

Eu não poderia gritar, poderia? Doeu e ainda dói, mas falar agora?

 

Será que quem irá me ouvir saberá dar vazão ao que eu sinto?

Será que entenderia a amplitude do que eu vivi, ali sozinho...

E se minhas palavras falharem e eu chorar na frente de todos,

Estarei preparado para expor o que me foi retirado à força?

Terei que passar por um corpo de delito? Irão me tocar de novo, e agora?

De novo me sinto homem, mas agora condenado aos próprios medos,

Encarcerado sem chave de saída por dentro, dentro?

 

Sofri uma ereção instantânea, poderia ter resultado em um filho,

Agora sou um assassino? O que sobrou do que eu era?

Minha voz masculina, grave, agora está rouca em soluços,

De vítima a agressor, de agredido a silenciado

...um passo não percorrido, carência de lógica, razão, sentido,

 

O que estariam a procurar? O que estariam a tirar de mim, se não a vida?

Me fizeram parecer fraco, me condenaram a poeira da terra suja,

Sujaram meus lábios agora sou um pecador? Um predador?

Ainda posso sentir aquele peso sobre as minhas costas,

Me esforcei, tentei empurrar para longe, mas nada...

Acordo suado, enfraquecido, ela me abraça, está ao meu lado,

Eu te amo, sou eu meu amor, ela fala com suavidade,

Não tenha medo, foi apenas um pesadelo... choro colado em seu peito, seguro.

Declaração no Jornal

Em 2016, o sangue manchava as páginas dos jornais,

E a capa gozadora, exibia os restos do que sobrara,

Pessoas insanas recebiam tudo que liam, sem se ater,

Já nem se surpreendiam com tanta barbárie,

E eu, sentado em minha escrivaninha esperava uma ligação,

Em um dia normal de primavera, me assaltava o coração,

 

O fato de amar tanto minha namorada, mas nos vermos tão pouco,

Foram poucos os momentos vividos juntos, mas os guardaria comigo,

Seus olhos, seu cheiro, seu gosto, ainda estavam em meu corpo,

A saudade, insatisfeita, tentava agarrar-se a distância em tentativa

Inútil de me fazer esquecer, dizia ela que onde um dia houve o amor

Restaria apenas um vazio, pois tudo de bom ali, ela consumiria,

 

Eu me negava a todo custo a este sentimento de angústia,

Ferir de morte onde um dia existiu algo tão bom,

Não seria tolerável, não quando a questão referente fosse amor,

É certo que amar a distância é frio, as vezes chega a machucar,

Mas há tantos que convivem no mesmo ambiente e nunca

Chegam a estabelecer uma fala profunda que dirá dividir a vida,

 

Apesar de habitarem o mesmo ambiente, vivem divididos,

Quatro pés perambulantes por suas casas frias e vazias,

Eu, porém, estava carregado por mim mesmo, sozinho, dois únicos passos,

Mas sentia-me preenchido eu havia amado, por um momento sublime

Que poderia recompensar uma vida toda sem ninguém,

Todavia, a maneira tolerável como as pessoas contemplavam

Aquelas notícias cada vez mais indigestas, me dava desgosto,

 

Nessa hora, eu ansiava pelo gosto dos seus lábios macios,

Pelo momento em que a tive em meus braços, bem apertados,

Como se quisesse mantê-la comigo por toda a vida,

Eu não poderia me acostumar com toda aquela barbárie,

Tendo jurado a ela, que a protegeria, que para sempre a amaria,

O amor pedia passagem em uma estrada onde perambulavam

 

Pessoas vazias, feito fantasmas, isso não parecia chamar-se vida,

Mas ninguém parecia se importar com isso,

Será que aquela a quem tanto amei também havia se encaixado nisso?

Estaria, ela, em negação ao seu direito de existir de forma digna?

Havia posto em cinco tábuas de madeira seu coração outrora apaixonado,

E agora o selava, sobrepondo uma tábua sobre ele, como se o dissesse: não ame!

 

E ainda o tivesse adornado com um laço negro,

Aquele mesmo que ela usava para adornar seus cabelos,

Aquele que eu adorava remover antes de provar os lábios que tanto me faziam falta,

Queira Deus que não tivesse o enterrado a sete palmos,

A partir do instante em que se torna apenas um corpo errante,

Condenado a meramente perambular sobre a existência,

Ainda haveria algo a ser feito pelo que se chama vida?

 

Espero que, tendo ela desistido de nós, já que nunca me chamou de volta,

Ao menos tivesse deixado descrito o endereço de onde poderia encontrá-la,

Eu escavaria o que fosse necessário apenas para tê-la de volta,

Espero não estar desejando muito, mas um corpo sem vida não me bastaria,

Do contrário eu poderia me entregar a qualquer uma,

Estivesse onde estivesse seu coração, eu juro: o buscaria!

 

Os anos haviam transcorrido como a enxurrada que passa sobre a terra,

Aquela passageira que a toca a superfície, mas não chega ao núcleo,

Ela, porém, quando me abraçou, quando me permitiu sonhar,

Foi além, e me levou junto, todos os olhos que eu contemplara sem ela,

Estavam perdidos em vazios distantes demais, inalcançáveis talvez,

Ela não, tivera sido tão próxima, tão frágil, tão minha, ainda podia senti-la,

 

Jamais seria possível esquecer, seria um tolo se pensasse diferente,

Sozinha, em um canto, agora feliz, concordava a saudade,

Parecia que ela havia desistido de me ver sofrer,

Eu paguei um preço caro por estes anos em que me mantive longe,

Mas, mais caro era o preço daqueles seres perambulantes lá fora,

O amor se espalhou por mim como o sangue em minha alma,

 

E agora a desejava de volta, quem poderia resistir a um pedido assim?

Eu sabia que tudo que vivi possuía suma importância,

Eu sentia que as lembranças me traziam uma falta desmedida,

Eu merecia tê-la de volta, apenas um instante apenas,

Minha velha jaqueta jeans estava pendurada na cadeira a minhas costas,

No bolso um bilhetinho onde guardei o endereço dela,

 

Peguei-a, vesti e saí pela mesma porta onde tantas vezes entramos juntos,

Quando encontrá-la iria dizer o quanto a amava, o quanto estes anos sem ela

Foram difíceis e desestimulantes, é certo que guardei na memória o caminho,

Mas o bilhetinho continha a letra dela, seu jeito e eu parecia ouvi-la falar,

Percorri a distância que nos separava com uma rapidez premeditada,

Mentir não era uma opção, me declararia e imploraria a ela por sua sinceridade,

Caso ainda estivesse em seu coração, ela seria sincera, me diria a verdade,

 

Tivesse me esquecido no decorrer destes anos, eu pediria uma oportunidade,

Não queria negar-me há felicidade, a amar e ser amado novamente,

Minhas intenções eram as melhores, meu sentimento o mais íntegro,

Sempre fui verdadeiro, até encontrei tempo para aprender a cozinhar,

Isso não seria uma qualidade a se desprezar, era o que ela me dizia,

Eu a entendi, a distância que nos separou agora virava poeira,

 

Tão ínfima, que seria carregada pelo menor vento,

Mas apagaria também nossos passos,

Aqueles em que vivemos separados um do outro,

Como se dissesse que o que passou não faria diferença,

Estaríamos juntos o que poderia importar mais que isso?

Se a distância me ensinou algo, foi ama-la sobremaneira,

 

Parei a distância de poucos metros, passei em uma relojoaria e comprei um anel,

Pedi ao síndico do condomínio, ele me relatou ouvi-la chorar em noites insones,

Disse que nunca soube de que ela tenha amado alguém,

Mas que ouviu de outras bocas, sobre relatos esparsos de certo homem,

Ele nunca soube a identidade, ela sempre soube ser bastante reservada,

Mas, em suas horas vagas gostava de folhear o jornal local,

 

Eu, então, fiz-lhe uma declaração relatando sobre a saudade,

Sobre o choro abafado pelo travesseiro, sobre perambular pela noite,

A busca-la por todos os cantos, onde imaginaria estar, até dormir no volante,

Com o carro estacionado em qualquer local incerto, sobre

O quanto sonhei com sua visita, o quanto ainda lembro de tudo

Como se fosse ontem e o quanto a amo para todo o sempre,

 

Solicitei informações sobre se ainda me amava, se ainda me queria,

Coloquei meu número a vista para que pudesse ligar,

O amor que um dia a entreguei, relatei: estava guardado,

Seguro dentro de mim, ela poderia buscar as informações que quisesse,

Não obteria outra, eu a amei e nunca me permiti, nem um instante,


Esquece-la, gostaria de ao menos um sinal para saber se isso era importante,

Aguardava qualquer gesto seu para reclamar-me para sua vida,

Caso ela não aparecesse até as três horas daquela tarde,

Eu bateria a sua porta, com flores, bombons, o vinho que ela gostava e o anel...

Feliz Ano Novo

 

O Feliz Ano Novo coloriu o céu do verão de 2014,

Nos mais variados tons e formas, as estrelas se apagaram,

Apenas naquele instante para 15 minutos depois, retornarem,

Sólidas, resistentes e ainda mais bonitas naquele céu de janeiro,

Na calçada da rua, eu contemplava a moça mais bonita que já vi,

Ela estava abrigada por paredes sólidas de pedra fria e austera,

 

De uma construção que se erguia rumo ao céus de 2015,

Posicionava-se junto a janela de vidro, frágil e bela,

Eu sentia que ela sonhava com algo diferente do que vivia,

Pareceu-me um convite para tira-la daquele lugar,

Por mais estranho que possa parecer, eu desejei abraça-la logo ao alvorecer,

Fechei os olhos e desejei aos céus que a fizessem descer,

 

Sair daquela espécie de pedestal, para permitir-se viver,

Eu poderia ama-la por uma vida inteira, e assim me comprometi fazer,

Prometer amor para uma vida toda fica mais fácil quando se está longe,

E até então, nunca tive a oportunidade de me aproximar,

Mas jurei para mim mesmo, que me aproximaria, escolheria as palavras certas

E por tudo que é mais sagrado, a conquistaria,

 

Faria dela minha esposa, a mãe dos meus filhos, minha rainha,

Embora tenha planejado a melhor das serenatas,

Fiz da melhor maneira que poderia, porém ela negou-se a me amar,

Disse que apesar de não estar com outro alguém,

Também não queria se envolver seriamente com ninguém,

Desejava passar algum tempo sozinha, para conhecer a si mesma,

 

No entanto, apesar de prometer que aceitaria sua decisão de bom grado,

Eu nunca desisti do amor que tanto mexeu comigo,

E meses depois, a avistei em um bar tomando cerveja com um estranho,

Naquele instante me senti ferido,

Como se uma descarga de um raio descesse sobre mim,

Entrei no local, pedi uma bebida, não lembro ao certo qual era,

Mas recordo perfeitamente de ela descer por minha boca feito veneno,

 

O veneno se espalha rápido nos corações apaixonados,

Principalmente naqueles que amaram em demasia e não foram correspondidos,

Sangue e ódio ferviam em mim feito algo que eu não conseguiria controlar,

Rumei ao beco da esquina, sentei na calçada, não resisti, me entreguei as lágrimas,

Um jovem vendo meu tormento me ofereceu uma arma a preço baixo,

Estava municiada, quente e metálica feito o veneno a correr em minhas veias,

 

Ainda consigo me recordar daquele momento fatídico do início do ano,

Eu poderia fingir que nunca me apaixonei e assim, virar a esquina e voltar para casa,

Poderia usar toda a minha força e tomar inúmeras alternativas,

Mas nem uma me pareceu mais atraente que esta...

Ali mesmo, sentado, me embriaguei, bebi como se nunca mais fosse ver a luz do dia,

Não me parecia digno viver sozinho depois de ter amado tanto,

 

Entregar meus sentimentos com toda a alma e receber só desaforo em troca,

Eu a amei muito mais que podia, por Deus talvez até mais do que ela merecia,

Eu trocaria todos os meus dias futuros por um único beijo da sua boca,

Mas ela sempre esteve fora do meu alcance, nunca me pertenceria,

Se for para amar sem ser amado eu preferiria um beijo embebido em ácido,

Em que seria condenado a desfalecer aos poucos, quente e úmido,

 

Estatelado dos seus braços, ferido de morte por dentro,

Lembro da forma como ela olhou em meus olhos, apesar de não dizer nada,

Eu senti dentro de mim o quanto me amava, pude ler isso em sua boca,

Em um sussurro emudecido pela timidez da sua fala macia,

Eu me comprometi tanto, dei tudo de mim, fiz tudo que podia,

E agora chegava um estranho qualquer e a tirava de mim, sem razão,

 

Pagava tudo de melhor para ela, parecia esfregar dinheiro na minha cara,

Como se dissesse que eu nunca a tive por outro motivo que falta de emoção,

Eu não merecia isso, diante do tanto que a amava isso tinha nome: traição,

Ela não me pertencia eu sabia disso, mas seus sorrisos eram abusivos ao que eu sentia,

Minha jaqueta de couro, a mesma que comprei para vê-la,

Agora continha uma arma guardada em seu bolso,

 

No mesmo lugar em que já esteve o anel que eu a daria,

O anel que comprei usando todo o dinheiro que havia economizado,

Centavo por centavo e nunca me arrependi disso, pois sabia que ela valia,

Agora o anel estava no bolso esquerdo, as coisas mudaram dentro de mim,

Decidi retornar, contempla-la de longe, como sempre fiz diuturnamente,

Nunca mais consegui dormir uma única noite sem que a visse,

Sem admirá-la, sem querer trazê-la para perto de mim,

 

Me tirando dos meus devaneios, como se desanuviasse os meus sonhos,

Trouxesse um mínimo de lucidez a um coração atormentado pelo desamor,

Uma mulher surgiu na minha frente adentrando no local vendendo flores,

Ele comprou uma para ela, ela sorriu como se aquilo fosse tudo que mais desejasse,

 

Lágrimas molharam minha face quando recordei das 200 que ela recusou,

Nem se dignou a recebe-las, jogou todas de uma vez na lixeira,

Minhas economias, todo o amor que eu sentia, tudo caiu por terra,

Ele sorria e agora a beijava, isso era demais para o meu coração aguentar,

Ele batia, soluçava, ecoava em mim, não poderia resistir a esta dor tão frívola,

Eu ainda guardava no bolso a carta que havia feito para ela, a qual ela nem quis ver,

 

Peguei, olhei-a, rabisquei, talvez, minhas últimas palavras,

Dizem que tanto os assassinos quanto os suicidas vão para o inferno,

Inferno era ver tanto amor que eu tinha dentro do meu peito,

Escorrendo pelos vazios da minha alma, formando possas na terra fria,

Saquei a arma, não teria como fugir do que sentia: puxei o gatilho...

sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Bilhetinho

 

Eu caí em meio a calçada, dois pares de olhos arregalados

Me olharam de soslaio, levantei, bati a poeira da roupa e segui,

Meus joelhos arranhados foram reparados por dois olhos famintos,

De uma moça que me estendeu um lenço com o qual pude secar o sangue,

Eu sorri de forma melancólica, me senti envergonhado, insípido,

Parecia que os lábios dela tinham algo que me atraiam,

 

Me sentei sobre aquele banco verde da calçada, ela sorriu agitada,

Seu hálito quente sobre o meu rosto, tinha um gosto que eu desejava,

Depois ela, se ajoelhou ao meu lado e me ajudou a limpar o machucado,

Não soube o que dizer quando a vi beijar minha perna com um carinho

Quase materno, um sentimento puro que me deixou fascinado,

Eu teria dito a ela que estava apaixonado, se pudesse admitir isso para mim mesmo,

 

Lembro-me com os olhos incertos e distantes, talvez pudesse dizer com saudade,

Do momento em que ela se levantou com um sorriso radiante,

E correu os dedos deliciosamente sobre minha calça,

Repousando um beijo na minha testa, depois disse que eu iria ficar bem

E seguiu seu caminho perdendo-se para longe no horizonte,

Mesmo quando ela se afastou, meu carinho parecia irromper pela multidão,

E alcança-la, mesmo quando meus olhos não a avistavam mais,

Por mais longe que pudesse estar, senti que a alcançaria...

 

Naquele momento, eu não consegui pensar direito, tudo parecia estranho,

Mas a saudade queixosa que agora me aprisiona às lembranças,

Me implora para que eu tivesse tomado outra atitude, não a permitisse se afastar,

Penso comigo mesmo, que eu poderia ter dito algo, mas não confesso isso a ninguém,

Não lembrei de pegar seu número de telefone, nem ao menos pedi seu nome,

Feito um bobo, ainda sorri ao vê-la afastar-se,

Não sabia que naquele dia perdia alguém importante,

 

Alguém que eu guardaria comigo para o restante da minha vida,

É certo que há instantes eternos e que não precisam repetir-se

E há também aqueles que se prolongam no tempo,

Os quais se roga a Deus para que nunca tivessem nem ao menos começado,

O tempo é para uns o que não é para outros,

Tivesse percebido a oportunidade naquela bendita hora, teria a aproveitado,

Ela também poderia ter ficado, poderia ter tomado uma atitude diferente,

 

Ao invés de colocar-se em pé, olhar-me nos olhos e ainda beijar-me

Daquela forma gentil, quase materna, o que eu poderia ter feito?

Eu estava rasgado, sangrando, envergonhado, teria chorado não pela dor

Mas pelo constrangimento diante do fato, mas com muito custo

Engoli as lágrimas de uma a uma e fiquei parado feito um tolo,

A contemplar aquela moça sorridente que se desprendia em carinhos,

 

Os dias correram tranquilos, eu até consegui sorrir daquilo,

Embora, após uma semana eu ainda sentia os olhos dela presos em mim,

Fixos como se estivessem a me vigiar, a me atrair de alguma forma,

Eu não soube o que fazer, nunca senti algo assim,

Como foi cair feito um inconsequente esparramado no chão daquela cidade,

Só Deus em sua infinita bondade e sabedoria conseguiria responder,

 

Mas o bom disso tudo é que ela estava lá, e quando todos riram, ela me amparou,

Não teria como esquecer algo assim tão belo, inusitado e na falta de palavras

A gente se contenta em apenas sentir, em permitir que as coisas aconteçam,

Não há como se programar o destino, não é como um relógio que se põe para despertar,

As coisas acontecem na hora exata em que tudo deveria acontecer,

O fato é que contemplar a decoração pascalina que adornava a cidade,

Não deixava menos dolorosa a saudade que me acompanhava nas horas vagas,

 

O vento trazia algumas folhas secas para o vidro molhado da janela,

Ali dentro ninguém tinha conhecimento da saudade que me abraçava,

Decidi colocar minhas roupas para lavar na lavadora,

Recolhi todas, desde as que estavam esparramadas pelo chão,

Até as que havia deixado no cesto da lavanderia,

Ao revirar os bolsos para ver se não havia algum documento,

Por algum equívoco ali esquecido, encontrei um bilhetinho,

Bastante surrado, a alguns dias esquecido ali dentro,

 

Vez que o inusitado ocorreu de forma mágica aos meus olhos,

No bilhetinho estava rabiscado um número de telefone,

Estremeci de felicidade, é certo que estava um pouco apagado,

O último número eu não conseguia identificar se era um o ou um 8,

Mas, como toda a tentativa é válida eu iria me agarrar a isso,

E torcer para que fosse o número da moça,

 

Na primeira vez que liguei um homem atendeu, conversei um pouco,

Vi que era engano, não deveria se tratar da mesma pessoa,

Na outra tentativa, ninguém atendia, fiquei intrigado,

Mas nem por um instante me permiti desistir, aquele era apenas o início,

E eu iria até o final, dois dias de tentativas esparsas e inesitosas,

Uma voz melodiosa e feminina sorridente atendeu,

 

Perguntei seu nome e puxei assunto, vi que se tratava da moça

Que eu havia conhecido, me senti muito feliz, nada estava perdido,

Conversamos por horas consecutivas, e depois marcamos um encontro,

Cheguei 15 minutos adiantado, não sou tolerante a atrasos,

Nem ela era, percebi ao ver seu carro dobrando a esquina minutos após.

Belo Casal

Pendurei a placa de não perturbe na porta do quarto,

Fechei-a com um movimento silencioso,

Minha namorada me esperava do lado de dentro,

Sobre a cama eu havia posto rosas brancas,

No chão pétalas diversificadas e coloridas,

 

Eu nutria um amor por ela por anos seguidos,

E agora estudávamos juntos,

Tivemos a oportunidade de nos conhecer de maneira mais profunda,

Primeiro fizemos um trabalho escolar em dupla,

Depois combinamos um filme no cinema,

 

E agora finalmente nosso primeiro encontro privado,

Deitamos sobre a cama, falamos de sonhos,

Trocamos carícias apaixonadas, ela me confessou

Que nutria por mim sentimentos desde muito tempo,

E que, chegou a reprovar em uma matéria para estarmos juntos,

 

Repetir um ano no colegial parecia algo imaturo,

Mas foi prodigioso por me permitir estar neste instante ao seu lado,

Dividíamos um chocolate quente, lá fora a neve caía sobre a terra molhada,

Aqui dentro com as janelas fechadas, apenas podia se avistar o frio

Que, a esta hora, mantinha distância segura de nós dois,

 

A escolha do filme foi o momento mais difícil,

Haviam tantas opções, eu gostava de ação ela de romance,

Precisávamos encontrar algo que contentasse a nós dois,

Decidimos por uma saga reconhecida entre os jovens,

Um romance épico que retratava a história de um amor juvenil,

 

Em que o casal sofria e sofria, mas ao final, sorte teve o amor,

Por permitir que o casal ficasse juntos,

Claro que este fato se referia a um roteiro pronto,

Estabelecido pela mente de algum escritor,

Ou sabe-se se lá como defini-lo,

 

Mas o sabido é que o amor deve prevalecer,

Este pelo menos foi nosso consenso,

Com um beijo deitamos na cama abraçados para assistir o famoso filme,

Do qual havia tanto falatório nos corredores da escola,

Que ambos já parecíamos conhece-lo,

 

Claro que o filme nem ao menos era baseado em fatos reais,

Deveria estar distante demais da realidade atual,

Mas quem sabe pudesse oferecer uma ideia de como dirigir-se

No instante em que se decide que se ama alguém para sempre,

E das maneiras em que se pode convencer este alguém a acreditar nisso,

 

E nas formas possíveis de se entregar ao amor,

Viver uma vida toda com alguém merecia respaldo,

Sonhar um sonho a dois merecia abrigo de ambos,

Entre a pipoca e o desenvolver da trama,

Olharam-se e deram seu primeiro beijo,

 

Com um sorriso tímido voltaram-se para o filme,

De forma meia desatenta, ela pegou o celular

E aproveitou para registrar o momento em uma foto,

Postou na internet, com legenda poética...

Alô

Ele estava irreconhecível e inegavelmente apaixonado,

Contudo, até as 21 horas da noite de domingo

De certo dia de dezembro, ninguém sabia disso,

Ele mesmo demorou-se a aceitar o fato,

 

Então, pegou seu telefone e discou um número conhecido,

Não saberia digitar nem um outro número,

Mas aquele ele havia gravado com esmero e carinho,

Jamais esquecia os encontros românticos que tiveram,

 

Por ela, ele arriscaria perder tudo, família, dinheiro, etc,

Mas negar-se a tocar em seu corpo, beijar os seus lábios,

Isso com toda a certeza, nunca faria, a amava,

Jamais permitiria que alguém os distanciasse,

 

Colocava ela em um valor elevado em que jamais colocou outra,

Ela era perfeita, encantadora, sabia dominar o seu redor com maestria,

E ele aceitava suas imposições, curvava-se as suas objeções,

Os amigos haviam lhe dito que ele jamais a conquistaria,

 

Que ele jamais teria a chance de tê-la ao seu lado,

Que nem ao menos uma cerveja sua ela aceitaria,

Perderam a aposta, ela aceitou e fez ainda mais que isso,

Conquistou seu amor, seu carinho, sua admiração,

 

E agora, poderia admitir que ganhou seu coração,

Ao primeiro toque, ele lembrou-se que se negou a tirar fotos,

Não queria ver-se em imagens, não por estar junto dela,

Mas por necessidade de desapego,

 

Lembrava-se do quanto estava sofrendo, do quanto se sentia ínfimo,

E da forma como ela o envolvia em seu abraço,

E o fazia sentir-se digno, com autoestima elevada, sorriso no rosto...

No segundo toque, sentiu medo de que não fosse atender,

 

Então, pegou-se a imaginar o que ela estaria fazendo naquele instante,

No terceiro toque, sentou-se no sofá, pegou o controle da televisão,

E ligou-a em um canal qualquer, achou que queria assistir a um filme,

No quarto toque, pensou que ela teria reconhecido seu número,

 

E por estar ocupada ligaria em outra ocasião,

Quando pensou em desistir da ligação, assim que afastou o celular da orelha,

A uma distância segura entre o rosto e a mão,

“Alô”, ouviu-a dizer do outro lado da linha,

 

Ele sorriu contente, respondendo o alô

E convidando-a para dar uma volta na cidade,

Disse que estava sem nada para fazer e que... sentia saudade.

Eu Sou Uma Danada

Sem o troféu “A melhor” Nem a miss mundo, Ou a garota modinha, Simplesmente, Datada “a perfeita” Intitulada “A grande g...