Algo ainda me fazia insistir em meu destino,
Duvidava que fosse Deus, mas ainda não havia
Vendido minha alma ao inferno, a cedido ao diabo,
Você pode achar que eu desisti de viver,
Mas isso está longe de ser verdade,
É certo que agora estou com a cara no chão,
Tenho minha integridade violada pelas minhas costas,
Minhas mãos estão presas, emudecido está o meu coração,
“Estuprado – mãos ao alto”, pude ouvir através do silêncio
frio
Do estrondo que me feria por dentro,
Um grito silenciado na garganta, um homem ferido ao chão,
Na alma de um selvagem um gemido,
Ao meu redor o silêncio de pessoas que fingiam não ver,
Estavam cegas em si mesmas, fechadas em suas próprias dores,
Eu tinha sorte por ser dessa forma, não tinha?
Já pensou se pudessem ver através da minha cara tudo que eu
sentia?
Imagina se pudessem ver pelos meus olhos a dor que escorria?
Meu nome escrito em letras gritantes de vergonha,
Indigno, eu me sentia, carente de força para me levantar,
Palavras cuspidas escoriam por minha cara,
Me sentia cegado, emudecido, entregue a dor,
Via tudo que eu era tornar-se frio esvaziando-se em sangue,
Algo me consumia por dentro, roubava-me de mim,
Pobre homem que ousou sonhar alto demais,
Caiu ao solo seco, tiro certo, voz silenciada,
Pena de morte premeditada, violar-me até tirar-me de mim,
Eu teria sorte em estar vivo, não teria?
Eu deveria cooperar se quisesse salvar a mim mesmo,
Eu deveria me mexer, no entanto, caí estagnado,
A dor me corroía por dentro, sangue escorria em minhas
entranhas,
Uma vida roubada pelo vão de dedos ferinos,
Eu desejei falar, objetar, mas quem me daria ouvidos,
Eu era um homem condenado ao chão da terra fria,
Que agora estava molhada, embebida em lágrimas?
O que é isso que escorre em mim agora?
Preciso de água, sinto cede, preciso ir ao banheiro,
Algo dentro de mim não está certo, nada parece fazer
sentido,
Será que sobrou muito de mim para confirmar algo,
Será que um banho quente vai tirar o frio do corpo?
As marcas que sinto pesarem dentro do espaço
Que se abriu em minha alma, em meu peito?
De algum modo consegui esconder a dor, em algum lugar,
Agora o vazio aberto em mim poderia abrigar muitas coisas,
Eu poderia marchar feito um soldado armado,
Sem precisar me condenar aos becos da cidade,
Que já estava cansada de noticiar este tipo de espécie,
Diziam eles, espécie de crime, cultuado pelos ignorantes,
Esquecido pelos inteligentes, ignorados pelos que não
entendem,
Entendimento era tudo que eu não tinha naquele instante,
É cediço, que a lei me abrigava a denunciar o ocorrido,
Embora eu já tivesse conhecimento do tormento que seria
Tomar uma atitude desta amplitude, ouviria julgamentos,
Seria vitimizado, reviveria este momento por mil vezes
seguidas,
E aqueles olhos me seguiriam, talvez isso fosse o suficiente
para me manter calado,
De vítima a ofensor, eu havia sido estuprado quem queria
ouvir isso?
Do grande e forte homem que eu era, agora o que havia
restado?
Dói, sangra, fere a alma eu poderia alegar, mas quem
entenderia?
Eu merecia conforto, queria abafar o grito de socorro,
Mas me ensinaram a calar o choro, sofrer em silêncio,
Eu havia sido um alvo fácil, agora, porém, me sentia
agressor,
Cada vez que eu tentava citar o fato, buscando entender o
ocorrido,
As pessoas desviavam a atenção, pareciam estar ensurdecidas,
Haviam, então, se acostumado as violações, para ter direito
a ser alguém,
Cadê a bandeira que eu ergui buscando por dignidade?
Mesmo quando minhas queixas chorosas chegassem até a
delegacia,
Eu teria que enfrentar outros homens ou mulheres
Olharem no fundo dos seus olhos e dizer: “sim, sim, fui
ferido de morte”,
Há algo de pior para a alma de um ser que nasceu para ser
forte?
Condenado a prisão de sofrer calado, de vencer por si mesmo,
Eu procuraria por consolo, alguém levantaria a voz em meu
amparo?
Olhos famintos e reprovadores me cuidavam,
Me sentia vigiado, tentei me manter afastado,
Qualquer um teria feito o mesmo, mas me encontraram,
Mancharam meu corpo, cabularam meu pranto,
Eu senti medo, nenhum homem merecia ser ferido a este ponto,
Ninguém merecia provar tal dor dilacerante,
Meus punhos antes de aço, renderam-se presos,
Eu queria gritar sou homem, não faça isso comigo,
Mas foram poucos minutos, eu iria sobreviver,
Conseguia ver no rosto dos transeuntes que haviam outros,
E talvez, não parassem, alguém teria que dar um ponto final,
Não teria? De vítima a agressor um passo que não fora
prescrito...
Na noite seguinte, eu tomaria mais cuidado, repetia para mim
mesmo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário