Uma noite,
Eu sentei no sofá,
Meu pai ficou no chão,
Com o prato na mão.
Eu poderia dizer que não o vi,
Que não percebia o que fazia,
Ou que sim.
Escolha sua.
Eu peidei,
Peidei alto e potente.
Ele se irritou,
Eu o vi,
Fiquei com vergonha
E sorri.
- ah, pai.
O senhor está aí?!
Ele chorou.
- sim. Estou sim.
Ele disse,
Soltou o prato no chão
E foi em direção ao quarto.
- acredita que eu não te vi?
Eu indaguei,
Tirei os pés do sofá
E ao soltar no chão
Pisei no prato de comida dele.
Pensei, fedeu!
E fedeu bastante.
Ele pegou uma arma,
Uma espingarda,
E me pôs para fora de casa,
Pegou na minha orelha
Com aquela arma apontada
Contra a minha cabeça.
Me pôs na área de casa,
Na verdade
Me fechou no escuro.
Eram sete e pouco,
Eu acho.
Início de noite.
Mas estava escuro,
Muito escuro.
Eu senti pena dele,
Por quê eu pisei dentro do prato?
Por quê eu peidei?
Quis chorar,
Olhei para a porta,
E ele havia me empurrado
Usando a espingarda,
Colocou a ponta contra
A minha bunda
E gritou:
- atirei nela.
Atirei.
Eu não soube se sim.
Senti medo.
Depois ele virou a traseira
Da espingarda branca
Acinzentada
E bateu contra a minha bunda,
Me jogando na área.
Eu me segurei na grade feita
De madeira,
E chorei.
Senti medo,
Muito medo,
Senti pânico.
As horas passaram
E eu fiquei lá,
No frio e escuro
E vazio.
Aí ele apontou a arma
E houve o barulho,
Eu acho,
Eu penso que
Em algum instante houve.
Ficou um buraco
Na tábua da parede de madeira,
Aí ele saiu para fora,
Eu estava lá em pé,
Eu chorei tanto
Que molhou o chão,
Escorreu feito uma valeta
Por meu rosto,
Molhou meu calção,
Molhou meus pés,
Pingou no porão.
Ele voltou lá.
- eu atirei.
Acertei?
Ele gritou.
- eu dei sustinho nela.
Ele disse
E pôs a cabeça
Para fora da porta.
Eu olhei para ele,
Chorando,
Sem poder ver,
Chorando muito.
Eu senti medo estremo.
Depois, perdi a vergonha na cara,
Aquela que de antemão
Eu não tinha
E voltei para dentro de casa,
Sem dizer nada,
Eu sabia como abrir a porta,
Eu nem soube se estava tramelada,
Eu voltei,
Fui até meu quarto e deitei.
Eu nunca quis dormir,
Eu nunca mais quis dormir.
Hoje,
Vinte e três anos depois
Meu filho me olha e diz:
- obrigado mãe,
Por você estar aqui!
Isto me realiza,
Me dá orgulho do que fiz.
Ter voltado
Foi minha melhor atitude.
Deu meu filho para mim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário