Lá próximo ao penhasco
Ele fez seu castelo,
A trouxe consigo.
Este foi o início.
Na janela a vista era para o céu,
De um azul profundo
Que se estendia para distante.
Abaixo do céu pedras
Que ferviam ao sol,
Que queimavam ao toque,
Cada lágrima dela
Jogada sobre aquelas pedras
Tornaram-se vapor.
Todo o choro,
E antes do choro
Todo o seu suor
Em busca de mantê-los.
Além das pedras água azul e límpida,
Que se estendia para distante,
Entre o fogo e o azul,
Eventualmente algumas gaivotas.
Onde houve o amor?
No instante em que ela
Foi jogada contra a parede,
Com o pescoço comprimido
Contra a janela
Tão próxima a cair no penhasco,
Ela quis pedir para ele.
Mas calou-se,
Como falaria de amor agora,
Não imaginou que ter um corpo
Tão mais forte que o seu
Empurrando-a contra uma parede
Tão dura fosse tão doloroso,
Ela sentiu como se seus ossos
Estalassem.
Sentiu a pele rasgar-se,
Mas não houve marcas,
Apenas as da parede.
Quando olhou em seus olhos,
Não havia amor neles.
Mas havia uma intensidade de ódio.
Ela escapou,
Não caiu da janela,
Se salvou.
Mas seu medo
A impediu de contar com a sorte,
Saiu para o jardim
Ver a luz do dia,
Sentir o vento na pele.
Abriu sua sombrinha,
O sol lhe feria a pele,
Logo todo o sol se foi,
Caiu chuva grossa,
Ela sentou-se,
Com o vestido largo
Vermelho, preto e amarelo,
Solto na chuva que caia.
Sentiu entre pedras, terra
E pouco gramado,
Segurou a sombrinha armada,
Pernas seguras no corpo,
Uma mão estendida,
Baixou a cabeça para o céu,
Na mesma medida
Foi baixando a sombrinha,
A chuva lhe caiu segura
A pingos firmes e fortes,
E gelada.
Ela ficou ali
Por algum tempo
Provando a chuva no rosto,
Cabelos, pescoço e vestido,
E sapatos pretos de salto baixíssimo.
A água misturou-se a terra
E fez barro,
Grudou no vestido,
Ela quis sorrir,
Sentiu-se bem.
Sem ninguém para vê-la,
Ama-la ou ao menos cuida-la,
Ela decidiu levantar-se sozinha,
Se sentia intensa,
Via em seu marido esposo arredio.
O relógio pontuava as horas,
E nada parecia mudar,
Só restavam memórias,
De tempos a tempos,
De beijos remotos
Como um filme antigo
De imagem apagada e estragada.
O que houve com a estrada do destino?
Só funcionava de tempos a tempos?
Feito flores que desabrochavam,
Morriam e tardavam a renascer?
Ela juntou flores,
Chegou próxima a porta,
Esperou que ele sentisse sua falta,
Esperou que ao menos abrisse
A porta,
De tempos a tempos
Podia ouvir suas passadas,
Ele estava lá dentro e...
Nada?
Ela sentou-se na escada de madeira,
Tirou os sapatos,
Mostrou os pés,
Não sentia-se insegura
De sua beleza,
Estavam juntos,
Olhou para as três flores
Em sua mão,
E viu que houve amor
Entre eles,
De tempos a tempos,
Houve amor.
A porta não abriu,
A chuva não parou,
Ela fechou a sobrinha,
Pendurou num prego
Que havia na parede de fora
Da entrada de casa,
Viu a água escorrer
Feito uma torneira dela.
Abriu a porta pesada
De madeira grossa e escura,
E entrou.
Ele estava olhando a parede
Sentado na cadeira do jogo
Da mesa de madeira
Pesada e escura,
Tudo surgia que a noite se alinharia.
De tempos a tempos,
Como um rufar de tambores
Batendo em seus ouvidos,
Ele deitado adormecido
Surdo e emudecido,
Ela de olhos atentos e doloridos,
Houve um fim lá atrás,
Um fim que não foi visto,
Parecia ter passado despercebido.
Mas, não.
Ela foi até a cozinha
Em frente a ele,
Juntou uma faca,
Houve um fim
Não haveria outro,
Estradas entrelaçadas no destino,
Estavam previstas
E concretadas.
Andou até a parede do quarto,
Chutou com o joelho
A parede,
Caiu um tijolo
Pôs lá a faca,
Recolocou o tijolo,
Não haveria diante do fim previsto
O medo,
Ela não seria jogada na parede,
Menos ainda cairia
Naquele abismo profundo
E dolorido feito de pedras e dor.
Foi ao banheiro
Retirou a roupa,
Soltando levemente o tecido
Em seu corpo,
Feito uma carícia na pele alva,
Viu quando caiu no chão
Pesado e sujo de terra,
Pegou a manga que estava dobrada
Na parede,
Desdobrou-a e a estendeu
Para tomar banho,
Deixou a água gelada cair
Sobre ela.
Depois chacoalhou os cabelos
Escuros e encaracolados,
Enrolou-os entre os dedos
Para escorrer a água,
Jogou-os para a frente de sua mesma
Agachou-se um pouco
E bateu-os com a mão,
Redobrou a torneira e saiu
Escolheu um vestido azul,
Verde e rosa.
Retornou colocou a comida
No fogão de lenha,
Acendeu o fogo,
Ele desgostou de como ela fez,
Chegou por trás,
Pegou com dois dedos
Seu cotovelo e apertou,
Ela chorou sobre o fogão,
Ouviu o chiado,
Viu as lágrimas sumirem de lá
Sem deixar marcas,
Continuou ali até aquecer a comida.
Depois estendeu uma toalha
De pano branco na mesa,
Colocou os pratos,
Os talheres ao lado,
Encostou seus seios nos ombros dele,
Retirou o vestido azul e verde e rosa,
Que usava,
Ficou usando tecido fino
E amarelo.
Sentou-se a sua frente,
Comeu, esperou ele comer,
Desfez a mesa,
Limpou os utensílios na pia,
Com a manga dobrada de lá.
Foi até o quarto,
Ele irritou-se outra vez,
A pegou por trás
Quando ela levantava a colcha
Grossa da cama
Para deitar-se.
Outra vez,
E que fosse a última,
Jogou-a contra a parede,
Comprimiu seu corpo
Contra as pedras da parede,
Apertou sua barriga,
Jogou seu braço contra a parede
Com um estalo,
Ela fechou os olhos de dor,
Reabriu-os quando sentiu a faca
Entre os dedos,
Retirou-a e levou até a barriga dele,
Com um golpe.
Ele se afastou,
Olhos abertos e arregalados,
A boca quis falar
Mas não disse nada,
Sangue manchou seu pijama
Esbranquiçado,
A faca estava ali,
Ela defendeu-se pela primeira vez,
Fatal vez.
Ele cambaleou,
Tremeu caiu até a janela,
Abriu a boca,
A faca estava até o cabo
Dentro dele,
Ele sangrava e sangrava muito.
Foi olhar para ela,
Ela estava na parede
Ao lado dele,
Exposta e imune,
Séria sem dizer nada,
Braços esticados contra a parede,
Corpo colado
Como se fosse pedra.
Ele tentou retirar a faca,
Tropeçou nos próprios pés,
E caiu,
E nada parecia tão profundo
Quanto foi aquele tombo,
Ele caiu contra uma pedra,
A pedra desceu com ele
E caíram sem parar,
Em algum momento
Ele pareceu encontrar o fim,
Ela tardou a olhar.
Ela viu sangue
Através da janela,
Não era o dela,
Pela primeira vez,
Havia sangue
E não era o seu,
Ela sorriu.
Olhou e pareceu vê-lo,
Morto.
A chuva veio mais forte,
Lavou o sangue,
Limpou a dor.
Ela continuou recostada
Na janela,
A casa estremeceu,
Outras pedras moveram-se,
E nelas a casa desceu,
Toda,
E na casa a janela,
Na janela,
Ela.
Tudo caiu
Rumo aquela imensidão azul,
De água, céu e pedras,
Muitas doloridas pedras
A atingiram
E a dor foi intensa,
E terrível,
Seu peito sentiu a dor
De ser estraçalhado,
Ela foi com ele,
O castelo desmoronou,
E levou-os.
De tempos a tempos,
Caída a sangrar entre as pedras,
Olhos abertos para a chuva,
Ela pode ver seu fim,
Enxergar a dor,
Sentiu cada parte sua sangrar,
O sangue escorrer até o azul,
Estendeu a mão e o alcançou,
Sim, ele estava ali,
Ao seu lado,
Limpo sentindo a chuva,
Ela não viu,
Mas havia nele pouco sangue
E tão menos dor.
Alcançou sua mão e apertou,
Ele teve um último
Impulso de forças
E apertou sua mão também,
Ela, então, fechou os olhos.
Sua cabeça caiu para o lado,
De olhos fechados,
Sem vê-lo,
A dele não teve forças de mover-se,
A chuva caia inerte e fria,
Uma gaivota voou em cê,
Subiu para o alto,
Desceu até a água,
Percorreu sua margem
E não provou de nada.
Ele apertou mais a mão dela,
De tempos em tempos,
Por uma última vez,
Ela foi ficando fria,
A chuva caiu mais intensa,
Ele fechou os olhos,
Sua cabeça caiu para o lado dela.
A chuva não parou,
O castelo veio,
As pedras caíram,
Nada ficou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário