sexta-feira, 18 de julho de 2025

Depois do Fim

Marta piscou algumas vezes,
Tentou entender
O que houve,
Se viu dentro do carro
Esmagada contra o chão.
Estava imprensada
Contra o volante,
O carro estava tombado.
- um acidente, filho?
Meu filho!
Foi tudo que conseguiu dizer,
Depois veio a dor,
Uma dor terrível e inexplicável,
Algo próximo a morte.
Com custo,
Ela conseguiu remover
O rosto que estava colado
Ao vidro para-brisa do carro,
Empurrou o banco
Que a comprimia e buscou
Com o olhar pelo filho.
O viu imóvel e emudecido,
Sangue escorria do vidro
Onde ele estava colado.
- filho.
Ela interveio.
- filho, o que há?
Ele parecia não respirar,
Isto lhe deu uma força sobre-humana,
Conseguiu se empurrar,
Abrir a porta e caminhar
Recostada na lataria do carro,
Tocando os pneus
Que estavam para o ar,
E chegou na porta ao lado,
Onde estava o filho.
A porta estava imprensada
Contra a terra,
Amassada pelo peso do carro,
Ela notou,
Um tanto arredia
Que sofreu um acidente,
Seu carro foi jogado
Para fora da estrada.
- filho, tenha força
Por mim, eu te amo.
Ela tentou outra vez.
Com o coração aos saltos,
Nem sentiu a dor no rosto
Que sangrava cortado
Pelo vidro.
Nisto olhou para a cocha
E encontrou um pedaço
Enorme de vidro
Penetrando sua pele,
O removeu rápida,
E empreitou contra a porta.
- filho!
Gritou de novo.
Puxou a porta para fora,
E a abriu.
Depois se ajoelhou
E beijou o rosto do filho,
Limpou com as costas da mão
O sangue que escorria.
Depois disso,
Empurrou com toda a força
O banco para trás,
E removeu o filho do carro,
Ele continuou imóvel,
Como se estivesse morto.
Ela o pegou no colo
Foi até a margem da rodovia,
Esperou até alguém ajudá-la
E foram conduzidos ao hospital.
Ela sangrava muito,
O rosto se desprendeu
Em um lado dos ossos,
E os estilhaços do para-brisa
Lhe cortaram, também,
Na região do peito.
O filho não falou
Uma única palavra
Ou se moveu.
Ela o abraçou,
Sentou com ele
No banco de trás do carro
Que lhes deu carona,
O pegou no colo
E clamou por misericórdia,
Implorou a Deus
Que não o levasse,
Rogou para Deus salva-lo,
Usou todas as palavras
E orações que já ouviu
Implorando que Deus poupasse
A vida de seu único filho.
- ele tem dezenove anos.
Ela disse para o estranho
Que conduzia ela até o hospital
Da cidade mais próxima.
-Deus não pode levá-lo.
Ela tornou a dizer,
Tocando no ombro do estranho,
Que dirigindo,
Olhou pelo retrovisor,
Depois se virou para ela
Vendo sua dor
Se transformar em choro
E escorrer por seu rosto,
E roupa.
O estranho fez sinal
Com a cabeça de que não,
Balançando rápido
De um lado para o outro.
Ele trocou a marcha,
Então, viu que já estava
Dirigindo na última,
Mas, tornou a acelerar,
Precisava salvar estes dois,
A mãe parecia que iria morrer
De dor,
Medo e sofrimento.
- seus ferimentos doem?
Ele lembrou de pedir,
Para mudar o assunto
E trocar o pensamento dela.
- eu não posso perder
Meu filho.
Ela disse, simplesmente,
Parou de olhar para o rosto
Do motorista,
Através do reflexo do espelho
Retrovisor e olhou para fora,
Para a paisagem cheia de casas
Que mudava a toda hora,
- Deus, poupe meu filho.
Ela disse.
Como se Deus ao não ouvi-la,
Pudesse ouvir uma das orações
De alguém de dentro daquelas
Casas e confundisse as orações
E apenas desta vez,
A atendesse
E mantivesse seu filho.
Lembrou de avisar o esposo
Sobre o acidente,
Buscou o celular pelo corpo
E não encontrou,
Buscou no bolso do filho
E estava o dele lá.
Encontrou o número do esposo,
Escreveu uma mensagem turva,
Entre lágrimas e dor lancinante,
Como se as palavras rasgassem
Seu peito,
Invadissem por seus ferimentos
E se cravassem nela,
Ela olhou o filho outra vez,
Ele não se movia,
Parecia não respirar.
“sofremos um acidente,
Querido, o carro ficou no caminho
Nos busque no hospital...”
Ela olhou o filho,
Beijou seu rosto,
Tentou secar suas lágrimas
De sua face,
Seu sangue que por ventura
O tocou,
Ele continuou imóvel.
Ela clamou para Deus,
Parar seu peito,
E dar a ele a vida
Que arfava em seu peito,
Rezou que houvesse uma forma
De fazê-lo resistir.
“querido, reze.”
Ela conseguiu escrever
Depois de segurar o delete
Apertado e apagar a frase anterior.
O esposo, neste instante,
Devia estar com suas cervejas
Frescas bebendo sobre o sofá.
Inocente quanto a realidade,
Nem imaginaria a trajetória
Doentia que estava vivenciando.
Ela preferiu ir buscar
O garoto no colégio
Ao invés de Robson ir,
Ele bebia muito,
Ela não bebia nunca,
Mas, agora, ela bateu o carro.
Tentou buscar em sua mente
O que houve,
E tudo que encontrou
Foi um caminhão invadindo
Sua pista e se colocando
Contra o carro dela.
No entanto, tentou lembrar
Se onde acordou havia
Algo, contudo, não encontrou
Nada.
Parecia haver sinais de pneus
Derrapando sobre a pista,
Pneu queimado no chão,
Sinais negros e contínuos
Sobre o asfalto,
No entanto, só havia isso.
- você sabe o que houve?
Indagou ao motorista,
Ele estremeceu
E olhou para ela,
Depois se voltou para
A rodovia sobre a qual dirigia.
- não vi nada,
Apenas você e seu filho,
Você chorava muito
E sangrava por toda a roupa,
Porém, ele parecia estar
Abraçado a você...
Ele respondeu seriamente.
- mais... Nada?
Ela indagou,
Buscando sua imagem
Através do espelho.
- nada!
Ele disse.
- eu dirigia...
Ela falou.
Buscando o rosto do filho,
Acariciando seu ombro.
O homem chegou no hospital,
Buscou ajuda na recepção,
E levou a mulher sobre uma maca,
E o rapaz na outra,
Ela chorava muito,
Ele estava desacordado.
Ela insistiu em pegar sua mão,
Entraram juntos,
Com ela agarrada a ele,
Porém, o médico lhes indicou
Quartos separados,
Ela sofreu fraturas abertas,
A pele caia sobre a face,
Chorava desesperadamente,
No entanto, ele ignorava a vida,
Se está lhe percorria os pulmões
Parecia estar distante de seu coração.
Ele não parecia respirar.
Seu rosto estava com resquícios
De cortes,
Simples escoriações,
Mas, o pulmão estava imóvel,
O peito parecia estagnado.
Cinco horas depois,
Ela abriu os olhos
Dentro daquele quarto branco,
Que parecia um aprisionamento,
- Julho, filho, Deus.
Gritou.
Ele não respondeu.
Ela saiu desesperada para fora.
Ao abrir a porta do quarto,
Se deparou com o esposo,
Cheirando a cerveja,
A esperando.
- Julho morreu.
Ele disse, secamente.
Então, a segurou,
Ela perdeu as forças,
Cambaleou,
E seu rosto virou choro.
- Deus, traga meu filho.
Ela falou,
Se amparando no braço
Do esposo.
O velório iniciou no mesmo dia.
Seguiu até o seguinte,
Quando o filho foi enterrado.
Marta recolheu o carro,
Em homenagem ao filho,
O mandou para a oficina
E o refez na mesma forma,
Cor, placa e demais características,
Esperaria o filho para sempre.
O carro foi guardado na garagem,
E esquecido para manter sua originalidade,
Eventualmente, ela o pegava
E saia pelas ruas a buscá-lo,
Olhando de rosto em rosto,
Chamando seu nome
Em cada casa,
Cada janela por onde passava.
Robson insistiu
Em suas cervejas,
E optou pelo divórcio,
Não foi capaz de perdoa-la.
Na cidade vizinho,
Antônio brigou pela décima vez
Em menos de vinte e quatro horas
Com Marcos e Hugo,
Seus filhos.
- eu quero cerveja,
Me tragam meu uísque.
Marcos lhe trouxe vodca,
Indignado Antônio cuspiu
Contra seu rosto.
- você não presta pra nada,
Maldita a sua mãe
Que te abandonou comigo.
Então, bebeu quase todo
O conteúdo de uma só vez,
E retornou a olhar para o filho
Que o aguardava estagnado
E olhos assustados.
- você trouxe o uísque e a cerveja?
Ela perguntou.
- mas, você não gosta
Que a bebida esquente,
E se for ambas,
Mais a vodca vai esquentar.
O rapaz respondeu.
- maldito!
Ele gritou.
Jogando a garrafa contra
O rapaz,
Ela bateu em seu braço,
Depois na parede.
- eu nunca tive dois filhos,
Pensando bem, nunca!
Antônio gritou.
Hugo, se dirigiu para o quarto,
Pegou o celular e entrou
Em sua rede social,
Lá encontrou uma página
Com a fotografia de um carro,
Modelo antigo,
Cor escura e seu coração
Pareceu se apertar
Contra o peito.
Ele teve certeza
Que conhecia aquele veículo,
Anotou o telefone para contato
E decidiu marcar encontro,
Iria ver,
Quem era tal pessoa
Respectiva ao anúncio.
- Hugo, eu não entendo papai.
Ele bebe e briga,
As vezes, bate em nós,
Mas...
Marcos falou da entrada
Do quarto,
Então, fechou a porta
Atrás de si,
E abraçou o irmão
Sentado na cadeira da escrivaninha.
- digo isso, agora
Que ele está dormindo
E não irá ser violento,
Eu peguei a moto e saí
Da garagem,
Tinha dezesseis anos,
Então, cai e quebrei o braço,
A moto foi apreendida
E eu fui parar no hospital,
Meu pai foi me buscar bêbado,
Mamãe estava no trabalho,
Então, ele o trouxe por engano
E eu voltei de carona
Com um enfermeiro
Que ficou entristecido
Por eu ter sido abandonado.
O rapaz falou.
Hugo se moveu da cadeira,
Se voltou para o irmão
Estarrecido.
- como?
Ele indagou.
- verdade.
Marcos continuou.
-mas, eu não lembro,
Eu não entendo.
Hugo disse.
- eu o amo como a um irmão,
Eu só tenho você e papai,
Mamãe nos abandonou
E não se importa com nós.
Hugo ficou apavorado,
Num vislumbre de lembrança
Lhe pareceu ver o carro capotar,
Rolar pela rodovia,
Então, tudo ficou escuro.
Depois disso,
Ele parecia ouvir a mãe
Lhe chamar,
Também o pai.
Então, baixou os olhos
Para o celular
E o anúncio ficou ali parado
Em sua tela.

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Depois do Fim

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